Por trinta moedas |
"O mercado é sórdido!", assim dizia meu professor de Sociedade e
Economia na faculdade. Ele fazia referência à falta de escrúpulos nas
guerras e disputas de poder econômico, defesa e conquista de mercados
desde os tempos mais remotos da humanidade.
Aliás, dizia ele, que não há limites para mentiras, golpes, guerras,
injustiças, ameaças e todo tipo de baixarias quando o interesse
econômico está em jogo.
Não pense que o mercado é motivado por causas nobres! Ele enxerga como
produto e bens de consumo qualquer ação, serviço ou mercadoria que possa
gerar algum tipo de lucro, ainda que esta mercadoria sejam as coisas
que, em tese, não deveríamos tratar por mercadoria como, por exemplo, a
fome na Etiópia ou o analfabetismo no sertão brasileiro, mas há quem se
beneficie muito com a exploração destes "produtos" e, portanto, os
mantenha como estão, apesar do embrulho no estômago que saber destas
coisas gera nas pessoas de bem.
A grosso modo, o marketing é a ferramenta que estuda e analisa o mercado
para que um determinado produto seja melhor aceito e, consequentemente,
venda mais e/ou gere mais retorno de investimento e lucro. Ele observa
os concorrentes, a maneira das pessoas se comportarem, consumirem e,
então, define as estratégias de abordagem e sedução para aquele público
alvo específico.
Tenho visto, com muita tristeza, a fé ser tratada como um novo bem de
consumo. O marketing da fé é explorado à exaustão, definindo metas,
estratégias, mercados, linguagem, produtos e públicos.
Tudo vira
"produto": a pregação de um determinado pastor, o CD do cantor ou
ministério de louvor, as campanhas de milagres, as rosas ungidas, os
lenços, as sessões de descarrego e a "mídia", que até então era o culto,
agora ocupa lugar nas grandes emissoras de TV do Brasil porque este
mercado da fé está crescendo.
O problema é que aqueles que apenas
consomem fé, como um benefício, um produto de valor agregado, vão se
distanciando da verdadeira Fé, livre, libertadora e vivificante do
Evangelho. Ela é aos poucos apagada, substituída por uma fé presa ao
templo/loja e ao modismo cegante da época.
Na disputa deste "mercado gospel", na defesa da fatia deste "bolo(r) da
fé", por interesses econômicos, assistimos as mais horripilantes
safadezas e inacreditáveis mentiras, ao ponto até de "bispos" e
"pastores" simularem exorcismos com o testemunho de "demônios" para
desacreditar a igreja concorrente. "Hipócritas! Bem profetizou Isaías
a vosso respeito, dizendo: Este povo honra-me com os lábios, mas o seu
coração está longe de mim. E em vão me adoram, ensinando doutrinas que
são preceitos de homens" (Mateus 15.7-9).
Esta, infelizmente, é a realidade na grande maioria das "igrejas"
espalhadas por aí. E aqueles que nela estão viraram "fiéis" (cegos), não
de Deus, mas dos líderes destas empresas.
É claro que nem tudo está perdido. Ainda existe gente séria, discípulos
de Jesus. A Igreja (com "i" maiúsculo) é invisível e somente de Deus,
não pode ser negociada. O Reino de Deus não cabe atrás da plaquinha, nem
dentro do templo de nenhuma religião do mundo! Ele está presente onde
há corações sinceros e humildes, e para o desespero dos empreendedores
da fé, está muito além dos nomes das igrejas e comunidades.
Não vejo problema algum em se adequar a linguagem ou a forma de se
comunicar o Evangelho para que mais pessoas o entendam. Crianças e
adultos, por exemplo, exigem abordagens diferentes não só do Evangelho,
mas de tudo na vida; têm compreensões distintas sobre os mesmos
assuntos, então, neste aspecto, o jeito de se entregar o conteúdo deve
ser diferenciado para cada um. Simples assim.
Mas quando ao método ou à
estratégia são dados mais importância que à essência, então o que se
pensa ser o caminho em direção às Boas Novas de Jesus acaba se
transformando numa perigosa armadilha. As pessoas vão se prendendo à
forma, à linguagem, endeusando templos, lugares, líderes,
denominações/marcas e nomes.
Em busca de mais adeptos às suas igrejas ou de fidelizar seus clientes,
alguns líderes religiosos acabam vendendo a imagem de que a verdadeira
fé está naquele lugar, as outras igrejas são vistas como concorrentes e
desmerecidas. Música, estilo, "bênçãos", "milagres" e "cobertura
espiritual" são tratados como diferenciais e utilizados como técnica
para atrair mais gente.
Perceba como estamos tão vendidos às técnicas do marketing da fé que nem
diferenciamos mais as palavras "culto" de "produto". Quando dizemos que
temos "culto para jovens" ou "culto para senhoras" estamos dizendo, na
verdade, que temos "produtos para atrair jovens" e "produtos para atrair
senhoras ", porque o culto é somente para Deus, não para o homem.
Nós
nos esquecemos que não é o tipo de culto que deve atrair as pessoas, mas
sim a compreensão do perdão que recebemos de Deus. A Graça, ou seja, o
Dom gratuito de Deus é o que nos motiva a louvá-lo.
O perigo de se fazer do "evangelismo estratégico" ou do
"show/apresentação do culto" o alvo a ser buscado em si mesmo para
atrair as pessoas é que o mercado, como de costume, exige cada vez
mais. Logo, o próximo lugar que proporcionar a "melhor bênção/oferta",
"mais emoção" ou a "melhor apresentação do culto/produto" abocanhará a
sua fatia de mercado conquistado.
Quero deixar bem claro que não sou contra a utilização de música,
teatro, testemunhos, acrobacias, danças, pirotecnia e qualquer outra
expressão de arte para se anunciar o evangelho ou como vontade de
glorificar a Deus com tais atitudes. Mas não acredito na utilização
destas coisas como "estratégia" ou "técnica" para alcançar outras
pessoas "para Jesus". Tudo o que é estratégia deixa de ser verdadeiro
quando se trata do Evangelho.
O Evangelho nasce de dentro pra fora,
naturalmente. É produzido pela Verdade que faz morada em nossos corações
e alcança o outro ser humano. Não por ser simplesmente emocional ou
atrativo, mas por produzir Vida e luz/compreensão para o nosso caminho
em Deus.
A mensagem de Jesus nunca foi "venham ficar admirados com as coisas que
sei fazer!", mas "arrependam-se e creiam no Evangelho!". E ainda: "Tomem
sobre vocês a sua própria cruz e me sigam, fazendo as mesmas coisas que
eu fiz, ensinando e imitando a maneira como andei entre vocês!".
O Deus que não faz propaganda vazia de si mesmo te abençoe rica, poderosa e sobrenaturalmente!
Fonte: http://ovelhamagra.blogspot.com.br/2012/02/fe-no-marketing.html
Acesso: 21/10/12
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