A Justiça Federal suspendeu os editais de incentivo à cultura negra
lançados pelo Ministério da Cultura (MinC) em novembro de 2012, por
entender que eles representam uma prática racista. Os editais que somam
um total de R$ 9 milhões foram a principal novidade da gestão de Marta
Suplicy à frente do Ministério, que assumiu há nove meses.
A decisão, do juiz José Carlos do Vale Madeira, da 5ª Vara da Seção
Judiciária do Maranhão, foi publicada no Diário Oficial de
segunda-feira. Ele escreveu que o MinC “não poderia excluir sumariamente
as demais etnias” e que os editais “destinados exclusivamente aos
negros abrem um acintoso e perigoso espectro de desigualdade racial”.
Segundo o diretor do Instituto de Advocacia Racial e Ambiental (IARA),
Humberto Adami, a decisão é equivocada. “Ela deixa de reconhecer a
Constituição Federal, o Estatudo da Igualdade Racial e tratados
internacionais de combate à discrimição racial que são assinados pelo
Brasil desde 1960, no sentido de combater o racismo e fomentar a
inclusão dos afrodescendentes, que historicamente sofrem exclusão”.
Os editais suspensos foram: Apoio para Curta-Metragem — Curta
Afirmativo: Protagonismo da Juventude Negra na Produção Audiovisual;
Prêmio Funarte de Arte Negra; Apoio de Coedição de Livros de Autores
Negros; e Apoio a Pesquisadores Negros. O primeiro é de gestão da
Secretaria do Audiovisual (SAv) do MinC, o segundo, da Funarte, e os
dois últimos, da Fundação Biblioteca Nacional.
Para o assistente técnico do IARA, Antonio Costa Neto houve racismo
durante a escravidão, posteriormente com a teoria de branquear a
população e depois como política pública na educação e também na
imigração. “O racismo no Brasil em relação ao negro é uma questão
histórica” avalia. Então hoje tentamos desconstruir o racismo através de
políticas públicas afirmativas.
O magistrado leva em consideração o
momento atual, que não admite prática de racismo, mas deve considerar
também esses fatos históricos. Se fizermos um recorte racial, há poucos
produtores negros com acesso a essas políticas públicas.
Os editais foram lançados em 20 de novembro, data que se comemora o Dia
da Consciência Negra. A ideia anunciada por Marta era facilitar o acesso
a verbas por parte de artistas e produtores que lidam com a cultura
negra, cujos projetos seriam, de acordo com o MinC, pouco acolhidos
pelas políticas usuais de patrocínio. Todos eles já haviam encerrado
suas inscrições e deveriam anunciar os projetos habilitados no início do
segundo semestre.
O processo foi movido como ação popular pelo escritório do advogado
Pedro Leonel Pinto de Carvalho, do Maranhão, citando como réus a União
Federal, a Funarte e a Fundação Biblioteca Nacional.
“O edital tem uma natureza racista. Por que ele é apenas para pessoas
negras e não para brancos ou índios, por exemplo? É uma proposta que
gera preconceito” diz Pedro Eduardo Ribeiro de Carvalho, gerente
jurídico do escritório de Pedro Leonel.
Para Adami, a medida liderada pela ministra Marta Suplicy se insere no
princípio das ações afirmativas. É uma ação do poder executivo que visa
socorrer um determinado segmento da sociedade. Não deveria causar
estranheza, pois todos os dias temos algum segmento da sociedade
beneficiado por alguma decisão do executivo, judicário ou legisliativo.
Quando empresários recebem isenção de pagamento de tributos, ninguém diz
que é inconstitucional. Nesse aspecto, penso que não faltarão
argumentos para que a Advocacia Geral da União faça um recurso ao
Tribunal Regional em Brasília e que essa decisão seja sumariamente
cassada.
Em nota, o MinC informou que vai apresentar recurso à decisão: “O edital
da SAv é legal, constitucional e há segurança na regularidade da
política. O mesmo entendimento têm as áreas jurídicas da Funarte e
Fundação Biblioteca Nacional, que também entrarão com recurso”.
Fonte: O GLOBO / Acesso 24/05/13
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